Juízes e promotores denunciam projetos que comprometem funcionamento da Justiça
O ato nacional a AMAGIS e a AMMP reuniu membros do Judiciário e MP como forma de protesto aos projetos de lei que tramitam no Senado e poderá prejudicar a atuação e o plano de carreira dos órgãos públicos.
Juízes e promotores da comarca de Manhuaçu se reuniram no Fórum na terça-feira, 04/10, para divulgar o manifesto contra Projetos de Lei em tramitação no Senado que comprometem a autonomia e o funcionamento do judiciário e Ministério Público. Uma delas é a PLS nº 280/16 que prevê punições a crime de abuso de autoridade numa tentativa de intimidação e amordaçamento por parte do atual Governo. Os juízes e promotores protestam pela defesa da legislação que garante a autonomia funcional dos órgãos públicos, reforçando que caso o PLS seja aprovado poderá afetar importantes investigações como a Lava Jato. De acordo com a nota oficial, a medida ofende a Constituição Federal, a Lei Orgânica da Magistratura e a do Ministério Público. Os magistrados e promotores também reivindicam a recomposição dos subsídios das carreiras jurídicas e do MP. Há ainda a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 184/07, que permite acesso de delegados aos cargos de desembargadores e ministros do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
A Associação dos Magistrados Mineiros e a Associação Mineira do Ministério Público divulgou nota pública conjunta para denunciar e alertar a sociedade contra a aprovação de projetos desta espécie. Segundo as associações, eles afetam a independência dos órgãos que podem ser comprometidos na atuação do combate à corrupção. A AMAGIS e a AMMP explicam que não são contrários à lei de abuso de autoridade, mas o que preocupa são situações que comprometam a independência do Ministério Público e do Poder Judiciário prejudicando importantes investigações como a Lava Jato, Pandora e Zelotes.
Em entrevista ao Jornal Tribuna do Leste, o promotor de justiça do Ministério Público de Minas Gerais, atualmente lotado na comarca de Manhuaçu, Dr. Vinícius Pereira de Paula explica a situação. “Recentemente foi apresentado um Projeto de Lei que visa realizar modificações na lei de abuso de autoridade. A grande preocupação foi a rapidez que ocorreu a tramitação desse Projeto de Lei que dá margem para algumas situações permitindo a responsabilização pessoal de autoridades envolvidas na investigação criminal no exercício de suas atribuições que na verdade pertencem ao Estado” conta, “o grande problema está nessa urgência que foi atribuída ao projeto. A lei de abuso de autoridade é de 1965 e qualquer alteração dependeria de um debate entre as instituições envolvidas e os setores diretamente afetados a fim de aperfeiçoar a matéria. Existem várias propriedades técnicas que precisam ser corrigidas e submetidas a esses discussões”, reforça com preocupação.
A AMAGIS e a AMMP
Segundo o presidente da AMAGIS, o Desembargador Maurício Torres Soares “esse projeto visa engessar e impedir que o Ministério Público, o Judiciário e a polícia trabalhem nestes crimes de colarinho branco”, afirma o presidente.
O vice-presidente da AMMP, Eneias Xavier, diz que “para a sociedade, não é interessante um Judiciário e um Ministério Público sucateados e sem atribuições”. “Isso interessa a poucos. Interessa somente às pessoas que insistem na violação da legislação e da Constituição. Queremos alertar a sociedade sobre a importância de termos um sistema de justiça efetivamente forte, proativo e com instrumentos que lhe dão possibilidade de enfrentar a corrupção e a criminalidade, por fim, a lesão aos direitos difusos e coletivos”, defende o vice-presidente da AMMP.
O juiz de direito da 2ª vara criminal da comarca de Manhuaçu, Dr. Maurício Navarro Bandeira de Melo fala da importância do ato nacional como alerta à população. “Acho importante esta reunião entre os juízes e promotores para firmar posição em relação a esses assuntos que tem nos preocupado bastante. De certa forma nós temos percebido uma orquestração de interesses escusos visando denegrir a imagem da Magistratura e do Ministério Público”, diz o juiz.
Para o promotor Dr. Vinícius “isso acaba abrindo espaço para que a ação penal sirva, por exemplo, à vingança”. “Certas propriedades precisam ser debatidas e o projeto de lei precisa de análise mais aprofundada, seguindo os trâmites normais e não com essa urgência como está sendo feita. Não há meios que justifique a tramitação tão rápida superando os procedimentos próprios para a aprovação de um Projeto de Lei. Uma das situações que este PL prevê é que cometeria abuso de autoridade o juiz que decretasse a prisão preventiva fora das hipóteses legais. Acontece que na Lei Processual Penal, o critério adotado para a imposição de uma prisão cautelar não é matemático. Há uma margem de interpretação, e a partir do momento que se criminaliza essa interpretação corre-se o risco de prejudicar a atividade jurisdicional e o membro do MP que poderão ser responsabilizados no exercício de suas atribuições. Isso dificultaria o trabalho tanto do MP, quanto da Polícia Civil e da Magistratura.”, conclui Dr. Vinícius.
Recomposição de subsídios
Os PLS nº 27/16 e 28/16, que preveem recomposição dos subsídios das carreiras da Magistratura e do MP, estão parados sob a alegação de desequilíbrio econômico por parte do Governo. O Projeto de Lei que foi preparado para ser levado ao legislativo contempla o reajuste de 8% no ano de 2016 e 7% em 2017, que seria a recomposição parcial partindo da inflação com índices apontados para 25% neste mesmo período.
“A questão da recomposição dos subsídios tem sido, algumas vezes, mal tratada e não raro é colocada como se fosse um aumento de subsídios o que não acontece na realidade. O que nós buscamos é somente o reajuste. A recomposição das perdas que ocorreram em razão da inflação medida nos últimos anos.”, explica o juiz de direito Dr. Maurício Navarro.
Existe ainda a PEC nº 62/2015, que trata da desvinculação remuneratória automática dos subsídios, vencimentos e salário, que expõe magistrados e promotores à políticas regionais além de propostas de regulamentação do inquérito civil, perda do poder investigatório do MP e tentativa de anistia dos crimes de caixa dois.
“Este é outro ponto que nos preocupa: a possível desvinculação dos vencimentos dos Ministros dos tribunais superiores em relação aos juízes de primeiro grau. Isso na verdade encobre o verdadeiro intuito da ação que é de desvalorizar estes juízes que representam o primeiro contato com a população para a distribuição da justiça. Então nós também nos opomos a esta desvinculação. Nós não aceitamos. Achamos que todos os juízes, promotores e procuradores devem caminhar juntos em termo de remuneração”, encerra Dr. Maurício.
A mobilização foi estendida para o interior do Estado e atos públicos foram convocados pela Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas).
Na quarta-feira, 05/10, aconteceu também o Dia Nacional da Mobilização e Protesto em Brasília com o mesmo objetivo no Congresso Nacional.
Livia Ciccarini – Jornal Tribuna do Leste