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Precocidade infantil deixa pais e especialistas em alerta

O que é a infância afinal? Nunca se deu tanta atenção aos estudos da criança e da infância e as respostas a esta questão variam conforme a concepção que se tem delas. Para alguns é uma fase da vida onde reina a fantasia e a liberdade. Outros ainda consideram a infância como uma fase em que a criança vai ser preparada para o futuro. Elas estão cada vez mais expostas aos apelos do consumismo exacerbado, à erotização precoce e às agendas extracurriculares apertadas, que não deixam espaço para brincadeiras sem compromisso. Antes da hora, meninos e meninas são chamados a participar do mundo dos adultos, seja assistindo à televisão até tarde, navegando descontrolados pela internet ou saindo à noite para restaurantes com os pais, que não têm mais tempo livre com as crianças. Antigamente, criança era proibida de participar de conversa de gente grande. Atualmente, às vezes, elas são chamadas a dar palpite na separação dos pais, no noticiário do dia e até nas consultas com a pediatra. Elas podem estar vivendo e participando de problemas que muitas vezes não dão conta de opinar.

Ouça a entrevista com Milene Coelho

Influência da tecnologia

 As atividades recreativas tradicionais que envolvem a brincadeira de amarelinha, esconde-esconde, pega-pega, estão cada vez mais raras, portanto, a bola, bicicleta, bonecas, e patins, já não se constituem como brinquedos favoritos da infância moderna, visto que, a tecnologia na sociedade contemporânea é a referência do lazer, trabalho e conhecimento. Nesse sentido, os dispositivos eletrônicos tais como: tablets, computadores, celulares de última geração e jogos eletrônicos fazem parte do processo de industrialização, e tal fenômeno influencia diretamente na maturação cognitiva, afetiva e social das crianças, já que, o sedentarismo é inerente ao processo de automação gerado pela tecnologia, afirma a psicóloga Milene Coelho.

Ela acrescenta que as crianças do século 21 (geração alpha) nasceram em período no qual a tecnologia é o alicerce da manutenção das relações sociais, por conseguinte, torna-se quase uma tarefa impossível viver sem ela, “pois, as crianças antes mesmas de serem alfabetizadas aprendem a utilizar a maioria dos recursos disponíveis pelos aparelhos eletrônicos de forma aleatória sem haver objetivo específico, essa condição provoca dificuldades no processo de aprendizagem desse contingente no âmbito escolar. Portanto, é cada vez mais comum ver a criança no computador dos pais digitando seu nome, ao invés de praticar sua escrita no caderno de caligrafia”, aponta.

O fato das crianças substituírem as brincadeiras clássicas e atividades nas quais envolvem movimento físico por jogos eletrônicos, computadores, videogames, entre outros, podem comprometer a saúde física e psicológica da criança, provocando o isolamento social da mesma, pois, cada vez mais crianças são acometidas pelo fenômeno da obesidade em função do sedentarismo causado pelos dispositivos eletrônicos. A obesidade configura-se como uma das doenças causadas pelo sedentarismo, portanto, as crianças que não se movimentam têm maior probabilidade de adquirir diabetes, problemas cardíacos, hipertensão, entre outras.

Ouça outro trecho da entrevista com Milene Coelho

Apesar de existirem consequências negativas da tecnologia na vida das crianças, as mesmas ao apresentarem maior contato com computadores tendem a ser mais inteligentes, dessa maneira, no caso da habilidade referente à escrita as crianças podem surpreender no relato verbal, visto que, as mensagens instantâneas estimulam esse contingente a escrever cada vez mais, aumentando assim o vocabulário das crianças.

Para Milene Coelho, diferente do que muitos pensam, a tecnologia pode ser uma grande aliada no ensino das crianças, tanto nas escolas quanto em casa. “Mas, este uso deve ser ponderado e fiscalizado para que evite influências negativas e não se torne um mal para o desenvolvimento sadio de uma criança”, alerta.

O papel dos pais

Por certo que o mundo de hoje não é o de antigamente em que filhos tinham um “temor reverencial” aos pais e a rebeldia própria da adolescência não se confundia com filhos agredindo e até assassinando seus pais, como frequentemente tem noticiado a mídia. Entretanto, não se pode com isto simplesmente “lavar-se” as mãos, atribuir a culpa de tudo para fatores fora da família e acharmos que uma solução mágica irá resolver todos os problemas inerentes à criação dos filhos da noite para o dia. “A solução precisa passar primeiro pela conscientização geral e cada vez maior que cada pai deve ter pela criação de seus filhos e que esta tarefa não pode ser tida como delegável, cabendo aos pais um cuidado diuturno com cada ato, com a educação permanente, e com o planejamento do futuro que se quer para seus filhos,” destaca a psicóloga. Assim, é dever dos pais ou responsáveis legais educação de sua prole, através de argumentos que possibilitem o diálogo com crianças e adolescentes e sirvam para demonstrar que os mesmos não podem fazer tudo o que desejam sem respeitar a autoridade daqueles que exercem o poder familiar. “Carinho, afeto e atenção são os facilitadores da construção de uma personalidade sadia e de um bom caráter. Porém, o primeiro fundamento para uma educação de resultados positivos é estabelecer limites. Os filhos são nossos espelhos, refletem nosso melhor e nosso pior”, destaca.

Hábitos e rotinas

 Tanto os hábitos quanto as rotinas são de vital importância para a vida das crianças. Graças a eles, além do ambiente pacífico e estável em que a criança se sente segura, também é possível oferecer regularidade, constância e perseverança nas mentes dos jovens, algo que será muito útil no seu desenvolvimento até a idade adulta. A rotina trata-se de um costume pessoal que se estabelece por ser verdadeiramente conveniente, sem necessidade de modificação ou flexibilidade. Neste caso, pode ser algo tão simples como escovar os dentes após as refeições. Um hábito é um mecanismo de estabilidade que permite desenvolver as habilidades de um indivíduo. Refere-se a atitudes, comportamentos e costumes que levam a formar padrões de aprendizagem em diferentes situações, desde amarrar um sapato até organizar o tempo de estudo. “Limite é o estabelecimento, pelos pais, do que é permitido e proibido. É quando a palavra sim representa sim e não representa não. Quando o não se transforma em sim depois de uma choradeira da criança, evidentemente não se está impondo limites. O diálogo é fundamental para dar uma boa educação. Durante as conversas, pais e filhos devem ouvir e falar. É importante que os pais conheçam a realidade do filho para poder interagir. Os filhos devem respeitar os pais. Isso significa ter um sentimento alicerçado na confiança. Ter respeito é diferente de ter medo”, enfatiza a psicóloga Milene Coelho.

Interação com arte contemporânea

Nos últimos dias, a polêmica envolvendo a menina que presenciou a performance de um artista nu na abertura do 35.º Panorama da Arte Brasileira, no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), dominou as redes sociais e muniu acaloradas discussões. Um vídeo que viralizou no Facebook mostra quando a criança de aproximadamente quatro anos toca no pé do homem. Segundo o MAM, o evento era aberto a visitantes que estivessem no local. O museu também informou que havia sinalização sobre a nudez na sala onde a performance ocorria.

Para a psicóloga Milene Coelho, a arte estimula a criatividade, as questões do desenvolvimento das percepções auditivas e visuais dentro do contexto infantil. “É importante a criança ser exposta, dentro de seu desenvolvimento, a produções artísticas, sejam elas musicais, pinturas, esculturas. E elas mesmas podem fazer essa arte quando desenham, brincam de massinha. Os benefícios são muitos, passam pelo campo da criatividade, consciência corporal, aquisição de conhecimento a respeito de uma cultura”. Milene prefere não usar a expressão “limite”, mas “adequação à fase de desenvolvimento da criança”. “A arte, enquanto expressão da sociedade em que vivemos, e servindo como ferramenta de contextualização ao mundo que cerca a criança, deve, sim, servir também como ferramenta para levar a criança à reflexão. Mas essa reflexão será absolutamente inútil se não estiver adequada ao universo da criança, ou seja, respeitando as etapas de desenvolvimento”, completa.

De acordo com a psicóloga Milene Coelho, toda arte tem a sua história e a sua interpretação, e cada pessoa adulta percebe a arte e o seu contexto à sua maneira e de forma distinta. E, referindo-se ao nu artístico, ela afirma que uma criança nunca deve ser exposta a esse tipo de arte. “Crianças precisam brincar, passear e precisam de orientação. E, acima de tudo, serem preservadas e protegidas daquilo que não faz parte do seu mundo de criança e isto não inclui conteúdos sexualizados”, finaliza.

Danilo Alves – Tribuna do Leste

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