Mês da Mulher: data busca ampliar o debate sobre a igualdade de gêneros
No dia 8 de março foi celebrado o Dia Internacional da Mulher. A data é o símbolo da luta por igualdade de direitos e contra a violência de gênero. O Dia internacional também serve para recordar as conquistas das mulheres e a luta contra o preconceito racial, sexual, político, cultural, linguístico e econômico. Desde sua origem, ligada ao movimento socialista no início do século 20, as mulheres tiveram muitas conquistas, mas a violência e desigualdade de oportunidades de trabalho ainda existe.
O tema da igualdade de gêneros é recorrente em todos os segmentos da sociedade e em todas as partes do mundo, desde que as mulheres reivindicaram o direito de estudar, trabalhar, votar e ter os mesmos direitos e oportunidades dos homens, traduzidos em salários e jornadas de trabalho equiparados, conforme explica a escritora e acadêmica, Beatriz Zappalá Pimentel. “Os papéis e comportamentos de homens e mulheres em uma determinada cultura, ditados por normas e valores dos gêneros desta cultura, dão origem a diferenças de gênero. Nem todas as diferenças entre homens e mulheres implicam em desigualdades ou favorecem um ou outro grupo. Entretanto, tais normas e valores podem dar origem a desigualdades de gênero – ou seja, diferenças entre homens e mulheres que sistematicamente favorecem um grupo em detrimento do outro. O fato de que, em todo o mundo, as mulheres têm em média salários mais baixos do que os homens é um exemplo de uma desigualdade de gênero”, comenta Beatriz.
De acordo com ela, a evolução histórica do papel da mulher na sociedade e no mundo do trabalho mostra a ausência de direitos que a mesma teve desde os primórdios da humanidade e devido a isso, vem buscando através de lutas e conquistas, sair da obscuridade e do anonimato. Ela destaca que a estrutura familiar também passou por modificações desde seu surgimento até os dias atuais em diferentes momentos, a mulher se sentiu em situação inferior ao homem e, em muitas vezes, não conseguia impor uma necessidade que pudesse alterar o suposto estado de inferioridade. “Entretanto, o mundo da mulher passou e vem passando por transformações através da conquista de liberdade, nível educacional, redução familiar e também por poder contribuir no orçamento doméstico. Percebe-se que a disciplina e o talento profissional estão transformando a mulher e tornando-as concorrentes dos homens dentro do mercado de trabalho. Essa competição profissional acirrada faz com que haja avanço na qualidade e produtividade do trabalho que pode ser desenvolvido tanto por mulheres quanto por homens”.
A busca das mulheres pela equiparação dos seus direitos perante a sociedade não é assunto recente. Ao longo da história, várias mulheres, seja por suas ideias ou suas atitudes, se opuseram às restrições impostas à mulher, quebrando paradigmas e influenciando a mudança do pensamento das pessoas de seu tempo e também das que viriam depois. No Brasil não foi diferente, escritoras, professoras, políticas ou trabalhadoras foram capazes de inspirar importantes transformações que impactariam na vida das mulheres de hoje. “A partir do século XX a mulher começa a assumir importantes papéis na sociedade, após anos de marginalização e inferioridade. Ela cresce sua participação em vários setores da vida social, constituindo com isso relevantes fatos da história contemporânea. Também, após a criação de organismos internacionais, citando-se como exemplo a Organização das Nações Unidas, a participação ativa da mulher no voto, no trabalho e no governo tem sido fator relevante na conquista de seus direitos, sendo, portanto, considerada um sujeito que tem obrigações e direitos”, salienta a escritora e acadêmica.
Percebe-se que a sociedade está cada vez mais valorizando as características femininas fazendo com que deixem de ser coadjuvantes para que tenham acesso em diferentes segmentos profissionais e sociais como ocupando posições estratégicas dentro de diferentes segmentos da sociedade. Beatriz Zapalá afirma que ao ser criado o Dia internacional da Mulher, não se pretendia apenas comemorar. “Na maioria dos países, realizam-se conferências, debates e reuniões cujo objetivo é discutir o papel da mulher na sociedade atual. O esforço é para tentar diminuir e, quem sabe um dia terminar, com o preconceito e a desvalorização da mulher. Infelizmente, ainda existem muitos casos de preconceito, de violência contra a mulher, salários baixos, trabalho demasiado, entre outros. Mas não podemos nos esquecer de que muitas conquistas foram alcançadas ao longo de todos esses anos e, mais ainda, que a luta precisa continuar para que todos os direitos da mulher sejam assegurados. A Lei Maria da Penha, que entrou em vigor no Brasil em 2006, é um exemplo do esforço da sociedade em proteger a mulher e garantir seus direitos, punindo inclusive crimes de maus tratos à mulher dentro de seu próprio lar”.
Para Beatriz Zappalá Pimentel, mesmo que seja somente uma data, o dia 08 de março tem como objetivo não somente comemorar, mas realizar diálogos que permitam discutir o papel da mulher na sociedade em que se encontra. “Então, aproveitemos esta data tão importante para fazer uma reflexão sobre tudo o que as mulheres já passaram, reconhecê-las e parabenizá-las pela força que sempre tiveram e sempre terão para enfrentar qualquer tipo de obstáculo. E também por serem essas pessoas iluminadas, fortes e ao mesmo tempo meigas, meninas e mulheres, mães e trabalhadoras, femininas e determinadas”, finalizou.
Surgimento da data
As histórias que remetem à criação do Dia Internacional da Mulher alimentam o imaginário de que a data teria surgido a partir de um incêndio em uma fábrica têxtil de Nova York em 1911, quando cerca de 130 operárias morreram carbonizadas. Sem dúvida, o incidente ocorrido em 25 de março daquele ano marcou a trajetória das lutas feministas ao longo do século 20, mas os eventos que levaram à criação da data são bem anteriores a este acontecimento.
Desde o final do século 19, organizações femininas oriundas de movimentos operários protestavam em vários países da Europa e nos Estados Unidos. As jornadas de trabalho de aproximadamente 15 horas diárias e os salários medíocres introduzidos pela Revolução Industrial levaram as mulheres a greves para reivindicar melhores condições de trabalho e o fim do trabalho infantil, comum nas fábricas durante o período.
O primeiro Dia Nacional da Mulher foi celebrado em maio de 1908 nos Estados Unidos, quando cerca de 1500 mulheres aderiram a uma manifestação em prol da igualdade econômica e política no país. No ano seguinte, o Partido Socialista dos EUA oficializou a data como sendo 28 de fevereiro, com um protesto que reuniu mais de 3 mil pessoas no centro de Nova York e culminou, em novembro de 1909, em uma longa greve têxtil que fechou quase 500 fábricas americanas.
Em 1910, durante a II Conferência Internacional de Mulheres Socialistas na Dinamarca, uma resolução para a criação de uma data anual para a celebração dos direitos da mulher foi aprovada por mais de cem representantes de 17 países. O objetivo era honrar as lutas femininas e, assim, obter suporte para instituir o sufrágio universal em diversas nações.
Com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918) eclodiram ainda mais protestos em todo o mundo. Mas foi em 8 de março de 1917 (23 de fevereiro no calendário Juliano, adotado pela Rússia até então), quando aproximadamente 90 mil operárias manifestaram-se contra o Czar Nicolau II, as más condições de trabalho, a fome e a participação russa na guerra – em um protesto conhecido como “Pão e Paz” – que a data consagrou-se, embora tenha sido oficializada como Dia Internacional da Mulher, apenas em 1921.
Somente mais de 20 anos depois, em 1945, a Organização das Nações Unidas (ONU) assinou o primeiro acordo internacional que afirmava princípios de igualdade entre homens e mulheres. Nos anos 1960, o movimento feminista ganhou corpo, em 1975 comemorou-se oficialmente o Ano Internacional da Mulher e em 1977 o “8 de março” foi reconhecido oficialmente pelas Nações Unidas.
No Brasil, as movimentações em prol dos direitos da mulher surgiram em meio aos grupos anarquistas do início do século 20, que buscavam, assim como nos demais países, melhores condições de trabalho e qualidade de vida. A luta feminina ganhou força com o movimento das sufragistas, nas décadas de 1920 e 30, que conseguiram o direito ao voto em 1932, na Constituição promulgada por Getúlio Vargas.
A partir dos anos 1970 emergiram no país organizações que passaram a incluir na pauta das discussões a igualdade entre os gêneros, a sexualidade e a saúde da mulher. Em 1982, o feminismo passou a manter um diálogo importante com o Estado, com a criação do Conselho Estadual da Condição Feminina em São Paulo, e em 1985, com o aparecimento da primeira Delegacia Especializada da Mulher.
Danilo Alves – Tribuna do Leste