Realizado por alunos do curso de medicina do centro universitário, um levantamento trouxe importantes informações sobre os moradores em situação de rua de Manhuaçu.
Os resultados da pesquisa foram encaminhados para a Prefeitura e a Câmara de Vereadores, visando contribuir com a elaboração de políticas públicas para esta população.
Um estudo pioneiro conduzido pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas da Situação de Rua (NESPSR), em parceria com alunos do curso de Medicina do Centro Universitário UNIFACIG, analisou a situação de rua em Manhuaçu, durante os meses de agosto e setembro de 2024.
A pesquisa identificou 18 pontos de concentração na cidade e contabilizou 53 pessoas em situação de rua, com projeções indicando que esse número pode variar entre 53 e 80 devido a oscilações sazonais.
O professor da disciplina de Atividade Extensionista do Curso de Medicina, Dr. Igor de Sousa, responsável pela iniciativa, informa que o documento foi enviado pelo Centro Universitário UNIFACIG, Prefeitura e Câmara Municipal para avaliação das autoridades e proposição de ações futuras.
“O diagnóstico será essencial para que a sociedade e os agentes do Estado tenham a percepção sobre como atuar e que tipo de políticas públicas criar para a situação de rua. Sem diagnóstico não existe tratamento ou solução mágica”, afirma o professor.
A pesquisa revelou três perfis principais:
- Pessoas em pobreza extrema, que vivem nas ruas permanentemente (26,1% dos casos);
- Indivíduos em situação de dependência química, que alternam entre a casa e a rua devido a conflitos familiares (30,4%);
- Trabalhadores informais, como catadores, que utilizam a rua como meio de sustento, porém com menor uso de substâncias psicoativas (21,7%).
A pesquisa também mostrou que 89% dos entrevistados são homens, enquanto 11% são mulheres. A baixa escolaridade é predominante, com 42,9% tendo apenas o ensino fundamental incompleto e 14,3% sendo analfabetos. Em termos de saúde, 60% relataram problemas de saúde não tratados, enquanto o uso abusivo de álcool é comum, especialmente no primeiro grupo, onde 60% consomem bebidas diariamente.
Tempo nas ruas, educação e trabalho
A análise destacou que 38,1% dos entrevistados estão há mais de dois anos em situação de rua, demonstrando um enraizamento nas dinâmicas desse modo de vida. Em relação à escolaridade, a maioria tem apenas o ensino fundamental ou médio incompleto, com índices de analfabetismo entre 14,3% e 16,7%.
Em termos de trabalho, o acesso ao mercado é afetado por fatores como higiene, preconceito, falta de documentação e ausência de uma moradia fixa. Apenas 40% dos moradores de rua permanentes (perfil A) conseguem algum tipo de trabalho, enquanto nos perfis B e C esse percentual sobe para 71,4% e 100%, respectivamente.
Segurança alimentar e saúde
Em relação à segurança alimentar, o perfil A é o mais vulnerável, alimentando-se apenas uma ou duas vezes ao dia. No perfil C, apesar do trabalho informal, longas jornadas nas ruas comprometem a alimentação, enquanto o perfil B apresenta os melhores índices de refeições diárias devido à presença de uma moradia mais estável.
No quesito saúde, uma grande parte dos entrevistados em todos os perfis relatou problemas, mas o acesso ao sistema de saúde é limitado. A vacinação contra a COVID-19, por exemplo, foi menos frequente entre o perfil A. O alcoolismo é comum nos perfis A e B, embora muitos indivíduos não se reconheçam como dependentes.
Exposição à violência
A exposição à violência diminui conforme o indivíduo possui algum tipo de moradia e não utiliza substâncias psicoativas. O perfil A, que vive nas ruas e faz uso de drogas, é o mais vulnerável (60%), seguido pelo perfil B (42,9%) e pelo perfil C (16,7%). Já a violência patrimonial afeta especialmente o perfil A, onde 80% dos entrevistados relataram ter seus pertences confundidos com lixo.
Diretrizes propostas para políticas públicas
A pesquisa destaca que a situação de rua em Manhuaçu é resultado de uma complexa combinação de fatores econômicos, sociais e de saúde. Abordagens integradas e políticas públicas inclusivas são fundamentais para transformar essa realidade, garantindo dignidade e direitos humanos para todos. Este diagnóstico será uma base crucial para debates e a criação de políticas que realmente façam a diferença na vida dessas pessoas.
Para tanto, o estudo também apresentou uma série de recomendações para políticas públicas, incluindo:
- Tratamento de dependência química com foco na redução de danos e na criação de redes intersetoriais envolvendo a comunidade e o terceiro setor;
- Realização de campanhas contra a esmola nas ruas;
- Facilitação do acesso a serviços psiquiátricos desburocratizados para usuários de álcool e outras drogas;
- Democratização do acesso à saúde, mesmo sem documentação como o Cartão SUS ou comprovante de residência;
- Reformulação do sistema de acolhimento, como albergues, priorizando a individualidade, condições de higiene e redução do controle disciplinar;
- Equipes multidisciplinares como o projeto “Consultório na Rua” para ampliar o acesso à saúde;
- Capacitação profissional e ações de inclusão no mercado de trabalho, especialmente para o perfil C, que necessita de qualificação e apoio para melhorar suas condições de renda.
(Thomaz Júnior, com informações do Centro Universitário UNIFACIG)