O Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu agravo em recurso especial da Prefeita de Manhuaçu, Cici Magalhães. 20 anos depois, o Judiciário diz que ela é inocente e não comprou votos para derrubar o então prefeito em 1999, Geraldo Perígolo. Na decisão, o Ministro Napoleão Nunes Maia absolveu Cici Magalhães da condenação por improbidade administrativa sofrida em primeira e segunda instâncias.
Na prática, Cici Magalhães não é mais enquadrada nas regras da lei da ficha limpa e pode se candidatar a novos cargos. Além de eventual ressarcimento, o tribunal propunha multa e cassação dos direitos eleitorais dela por oito anos e também a proibição de contratar com o poder público por cinco anos.
No julgamento do STJ, o ministro Napoleão Nunes Maia apresentou o voto favorável ao recurso de Cici Magalhães em que o correto era a absolvição.
Em sua análise do agravo do recurso especial, o Ministro Napoleão Nunes Maia explica que o caso foi baseado no inquérito civil realizado pelo Ministério Público, onde não houve contraditório e ampla defesa. Ele pondera que a acusação de compra de votos tem que ser comprovada: “O caso concreto, por sua vez, está repleto de elementos do Inquérito Civil alusivos pessoas que ouviram dizer a suposta compra de votos de vereadores”.
Sobre os processos de licitação que teriam sido suposto fruto de compensação pelo voto em favor da cassação do então prefeito, o ministro do STJ também argumenta que não há evidências materiais de que os contratos administrativos tenham sido uma compensação para o voto de cassação.
Ele ainda questiona que a Justiça Mineira não analisou o julgamento do prefeito. Longe de querer uma revisão do ato da Câmara de 1999, Napoleão Nunes Maia pondera que “não há menção ao que se estava a tratar contra o então Prefeito, de que conduta teria sido acusado, já que é a partir desse fato que se tem a suposta prática ímproba de compra de votos. Qual terá sido a razão da cassação do Prefeito? Será que a Câmara de Vereadores nada apurou contra ele e lhe cassou o mandato somente porque os Edis foram corrompidos? Nada disso foi examinado”.
Por fim, a questão central: cabia ao Ministério Público provar que a então vice-prefeita cometeu os atos de improbidade dos quais ele acusava e isso não foi feito. Na decisão do STJ desta semana, o Ministro Napoleão Nunes Maia deixa claro que a condenação foi baseada em achismo. “Não se deve acolher os boatos de rua, as maledicências, as conversinhas desautorizadas como se fossem elementos probatórios. O Direito Sancionador só se interessa por fatos comprovados, não lhe sendo relevante o diz-que-diz que infesta os politiqueiros e fornece boa munição para tantas verberações sem futuro”.
Numa sentença de oito páginas, o ministro do STJ lança mão da literatura para destacar a importância das provas. Na trilogia dos livros do absurdismo, o escritor argelino Albert Camus, em sua obra mais famosa – O estrangeiro, conta que o personagem principal, Meursault, é julgado por homicídio de um árabe. Durante a sessão de julgamento, a preocupação lançada pelo acusador está centrada no fato de que o acusado não expressou emoção alguma no enterro de sua mãe, não chorou, não disse uma palavra, não quis que abrissem o caixão para vê-la pela última vez e aceitou um cigarro de uma pessoa no velório. As testemunhas chamadas ao caso confirmaram esses eventos. Pouco se disse no julgamento acerca do fato em si e a frieza do acusado no velório da mãe foi o suficiente para ligá-lo ao homicídio.
“Essa literatura bem ilustra que, no caso concreto, a preocupação está centrada na circunstância de que os acusados não contrabalançaram a investida acusatória, isto é, que ficaram inertes aos elementos do Inquérito Civil, este que, consoante reconhece a própria Corte Mineira, tem valor relativo, dada a ausência de contraditório. Porém, a inércia do acusado não lhe deve causar revés algum e esse é um dos pilares do Processo Sancionador contemporâneo”, sentencia o ministro Napoleão Nunes Maia.
Ao final, ele reforça que se não fossem necessárias provas, nem mesmo se precisaria de processo judicial. “Não creio que se possa tomar os termos da acusação – de qualquer acusação – como suficientes ou bastantes em si mesmos para fundamentar a condenação, o que tornaria sem utilidade, em tal caso, o próprio processo judicial, já que o inquérito ou a denúncia bastaria para a formação do juízo condenatório. Convém relembrar que, no Direito Sancionador, todas as provas cabem à acusação e, se não ocorre a sua produção, a absolvição do imputado é medida que se impõe. Esse raciocínio é tão evidentemente aceitável, que não se faz necessário desenvolver argumentos para demonstrar a sua juridicidade”.
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