Artigo: Os três conselhos
Por Felipe Moura Lima
Dia desses, perdi preciosos minutos com um vídeo que tem feito almas puras verterem as mais cristalinas lágrimas. Traz a saga de um pobre camponês recém-casado, que se despede da jovem esposa e sai à procura de trabalho. Após vários dias na estrada, ele encontra ocupação numa fazenda, onde se estabeleceria. Contratado, pediu ao patrão que todo seu ordenado fosse depositado numa poupança. Passados vinte anos, o camponês pediu as contas e o patrão lhe propôs o seguinte: “Dou-te todo o salário ou três conselhos. Se quiseres o dinheiro, não terás os conselhos; mas se quiseres os conselhos, não terás o dinheiro”. O camponês, caboclo honesto e trabalhador, mas meio pancado das ideias, ficou de pensar. Matutou a noite toda e decidiu pelos conselhos. O patrão, muito “bondoso”, como costumam ser os fazendeiros, deu-lhe três pães: dois para serem comidos durante a caminhada e um para comer com a esposa, quando chegar em casa. E os conselhos: “Vá pelo caminho mais longo, sem pegar atalhos; não dê ouvidos a coisas do mal, como gritos de socorro, por exemplo; não espanque sua mulher antes de saber que o cara que está com ela pode ser o seu filho”.
Bom, há várias versões dessa “fábula” na WEB e quem quiser detalhes, que assista a um vídeo daqueles e confronte com este texto. A mim, não interessa traduzir em palavras, imagens e sons tão comoventes. Ademais, ainda que eu quisesse, jamais conseguiria fazer alguém chorar com um texto. Mas quero apenas refletir sobre mensagens como essas, que trazem no seu bojo alguma subliminaridade.
No vídeo, o patrão é um homem bonachão e parece preocupado com o empregado, que volta para casa guiado pelos “três conselhos”, caminha por vinte dias e tem como alimento apenas dois pães. Não pôde pegar carona, pois o primeiro conselho dizia para “não tomar atalhos”; não prestou socorro a um agonizante, pois o segundo conselho advertia para “fugir do mal”; enfim, o mais sensato dos conselhos, o terceiro, também foi fielmente seguido: evitou cometer um crime ao encontrar a esposa acompanhada de um homem. Dispararia contra os dois, mas pensou: “Não posso tomar decisões com a ‘cabeça quente’!”
Como nas fábulas infantis, o final foi feliz. Depois dos abraços e beijos, como convém a certos reencontros, a mulher foi para o fogão preparar o café, enquanto o filho… ah, não me lembro. O pai pegou o último pão e… surpresa das surpresas: estava recheado de dinheiro! Como a poupança de vinte anos de trabalho coube num pão, não se sabe. Se bem que o pão era grande, mas…
Em tempos encardidos como estes, quando deputado propõe que lavradores trabalhem em troca de casa e comida, o vídeo traz uma mensagem subliminar: o patrão decidindo sobre a vida do empregado, que é tratado como súdito. É uma história piegas, desarrazoada, eivada de machismo, de egoísmo e com apologia à vassalagem, mas faz sucesso nas redes.
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